Viatura blindada é produzida com a participação de várias empresas brasileiras
Jovana Bubniak
Um projeto complexo e que exigiu cooperação entre diversos atores do Exército Brasileiro, Indústria Civil Nacional da Base Industrial de Defesa e empresas estrangeiras. Estamos falando do Guarani, viatura blindada que nasceu do sonho do Exército Brasileiro e da necessidade de modernização do Cascavel e Urutu.
Os estudos para a obtenção da Nova Família de Blindados de Rodas do Exército (NFBR), que posteriormente veio a se chamar Projeto Guarani, teve início em março de 2003, quando o Exército decidiu que não iria realizar uma aquisição internacional da nova Viatura Blindada de Transporte de Pessoal Média de Rodas (VBTP-MR), mas obtê-la por meio de pesquisa e desenvolvimento no País.
De acordo com o Exército Brasileiro, uma viatura blindada operacional compõe-se da Plataforma Automotiva, do Sistema de Armas e do Sistema de Comando e Controle. A empresa Iveco foi a vencedora do processo para o desenvolvimento da plataforma automotiva. O sistema de armas – REMAX – foi desenvolvido pelo Centro Tecnológico do Exército (CTEx) em parceria com a empresa Ares. Já o sistema de armas de canhão automático selecionado foi o UT30BR, da empresa ELBIT/ARES, e o sistema de operação manual foi o MR-550, da empresa PLATT.
Segundo o Coronel R/1 Eduardo Gomes Ferreira Pinto, que foi supervisor do Projeto Guarani de 2005 a 2018, a integração gerencial coube ao EB, que é o responsável pela condução e gestão do projeto como um todo, e a integração técnica coube à Iveco, no sentido de receber as informações das interfaces (mecânica e eletrônica) dos sistemas de armas e de comando e controle e realizar a instalação desses sistemas à plataforma automotiva de forma harmônica para o cumprimento das missões. “Fica evidente a elevada complexidade do projeto, sendo fundamental a cooperação entre os diversos protagonistas do Guarani”.
De acordo com o Coronel, a participação de várias empresas no processo de desenvolvimento da viatura se fez por meio de contratos firmados com o Exército, sendo a gestão desses contratos, que são conexos, outro grande desafio para a equipe do projeto. “Esse caminho pode ser replicado em outros projetos, pois durante e após a criação do Escritório de Projetos do Exército (EPEx), a regulamentação foi sendo aperfeiçoada no sentido de dar segurança jurídica e padronizar a gestão de seus Programas Estratégicos”.
Para o Coronel Eduardo, o grande produto foi a retomada da capacidade de produzir no país viaturas blindadas de rodas. “Para isso foi criada uma grande rede de fornecedores locais dos quais podem ser citados ARES, CBC, Grupo INBRA, ALLTEC, entre outros. Isso gera um grande reforço à Base Industrial de Defesa (BID) e uma projeção da imagem do Brasil como importante produtor de Material de Emprego Militar (MEM) no cenário internacional”.
Índice de Nacionalização
Segundo o General de Divisão Tales Eduardo Areco Villela, Diretor de Fabricação do Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT), e que fez parte do grupo inicial dos trabalhos no Centro Tecnológico do Exército (CTEx), os contratos previam a obrigação da fabricante dos veículos de atingir, até o final da vigência desses termos, índice de nacionalização igual ou superior a 60% do preço da plataforma automotiva, contribuindo para o fomento a indústrias nacionais e à Base Industrial de Defesa (BID).
“Desde então, fabrica-se em média 60 viaturas por ano na planta da Iveco Defence Vehicles (IDV) em Sete Lagoas (MG), destacando-se que o produto está em desenvolvimento contínuo mediante acirrado contato técnico da empresa com a Diretoria de Fabricação (DF), a qual tem feito a interface entre o usuário final e a IDV”.
De acordo com o General de Divisão, o Projeto Guarani 2.0, uma versão mais atualizada da VBTP que contempla diversas oportunidades de melhoria apontadas pelo operador, é hoje o foco principal do Exército Brasileiro, além da Viatura Blindada Multitarefa – Leve Sobre Rodas 4×4 (VBMT-LSR 4×4) e versões adaptadas do Guarani com implementos de Engenharia e de transporte do Morteiro 81 mm.
“Conclui-se que o principal motivo do sucesso do projeto se dá ao baixo custo da viatura em comparação às concorrentes internacionais, ao amadurecimento contínuo do produto, aliado à sua fabricação em solo brasileiro, contribuindo para a capacitação e fomento à indústria nacional”, afirmou Tales Eduardo Areco Villela.
O Diretor de Fabricação do DCT, afirmou ainda que, neste ano, novos desenvolvimentos internos ao EB e também junto à BID estão em andamento, de maneira a cumprir o estabelecido pelo Estado-Maior do Exército (EME), completando as lacunas de capacidades ainda existentes, fortalecendo a Soberania Nacional e contribuindo com o Processo de Transformação do Exército. “E claro, gerando mais empregos e internalização de capacidades no Brasil”, concluiu.
IDV
O Guarani é o primeiro modelo projetado e fabricado na unidade da IDV no Brasil, em Sete Lagoas (MG) – a primeira fora da Europa. Ela foi inaugurada em 2013 e, em 2014, foram entregues as primeiras 86 unidades do Guarani. Em 2021, a empresa concluiu a entrega da 500ª unidade ao EB e, atualmente, já são mais de 540 unidades em operação no Brasil.
Com capacidade para transportar até 11 pessoas, o Guarani pesa 18 toneladas, possui tração 6X6, pode chegar a 110 km/h e tem função anfíbia.
O blindado conta com o motor Cursor 9 Euro III, da FPT Industrial, configurado para entregar 380 cavalos. Especialmente para aplicação no Guarani, o motor recebeu reforços para atender as exigências da aplicação militar.
Segundo a IDV, a Ares atua juntamente com a empresa desde a primeira versão do blindado, na integração do sistema REMAX.
Há uma sólida parceria para o desenvolvimento de alguns sistemas de armas no Guarani e a expertise da Ares é de grande valia nesse processo, informou.
Além das unidades entregues no Brasil, a IDV está atenta e em contato com as Forças Armadas e de Segurança de diversos países para continuar avançando nas diversas negociações. Têm sido comercializadas unidades do Guarani para países da América Latina, Ásia, África e Oriente Médio.
Ares
Para a empresa Ares, responsável pela produção da estação de armas REMAX, participar do projeto Guarani demandou investimento para a produção seriada do produto, na estrutura de Suporte Logístico, na melhoria contínua de seus processos produtivos, maquinários e infraestrutura e na nacionalização de itens críticos.
Em 2021 a empresa apresentou a nova versão do sistema, o REMAX 4, que trouxe mudanças significativas como a redução da altura e do peso, aumento da capacidade do cofre da munição e a possibilidade de integração com outros armamentos, além de um sistema de alerta laser.
“A Ares tem mantido a linha de produção da estação de armas ativa e em desenvolvimento constante. Nossos investimentos em pesquisa e desenvolvimento não param e tem como objetivo principal aumentar o índice de nacionalização de nossos produtos, por consequência elevar a autonomia tecnológica do nosso país”, declarou o Diretor de Marketing, Frederico Medella.
Para a empresa, ter esse projeto desenvolvido com o CTEx e alinhado com a IDV desde a primeira versão do Guarani demonstra a importância e eficiência dessa parceria. “Esse é um case de sucesso e que pode servir de modelo para muitos outros projetos”, afirmou Medella.
Alltec
Um dos primeiros projetos de inovação dentro da Alltec foi na área de defesa, quando a empresa participou do desenvolvimento da blindagem das aeronaves militares AL-X, em conjunto com a Embraer e o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA). Nesse projeto, a Alltec foi responsável pelo desenvolvimento das etapas de laminação, montagem e pintura dos painéis balísticos. Esse trabalho de inovação resultou na aquisição de um grande conhecimento técnico e um domínio inicial da tecnologia para fabricação de painéis blindados, o que possibilitou mais tarde a elaboração de um projeto inteiramente próprio com recursos da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e apoio do Exército Brasileiro (CAEx – Centro de Avaliação do Exército e DF – Diretoria de Fabricação). Foi então que a Alltec desenvolveu a blindagem balística adicional para absorver o impacto de projéteis .50 AP (12,7X99 mm PFM2), para a viatura blindada VBTP-MR (Viatura Blindada Transporte de Pessoal – Média de Rodas) – Projeto Guarani. Esse apoio permitiu a homologação do kit completo da blindagem adicional, que foi doado ao CAEx com o aval da Finep.
A Alltec também obteve o TR (Termo de Registro) que permite à empresa fabricar e comercializar produtos controlados pelo Exército.
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